Publicado no portal realhiphop
Baixada Fluminense. Sexta feira, 21 de maio de 2004. Oito horas da noite. Estou em frente a UNIG (Universidade Iguaçu). Acabei de encontrar com um camarada, ele vai me levar até o acampamento 17 de maio.
17 de maio de 2003 foi à data da ocupação, data esta que serviu de nome de batismo para o bairro que está sendo criado.
Logo quando chegamos ao acampamento, fomos conhecer a cozinha comunitária, lugar onde Paloma tem sempre uma refeição disponível para quem não tem como cozinhar ainda. Como eu também não tenho como cozinhar, aceitei um belo dum rango caseiro. A essa altura o Dmc já estava com o estômago roncando de fome e não perdoamos, traçamos aquela comida e ainda pedimos mais (he he he). À noite de sexta serviu pra gente se integrar com a comunidade, pois o que estava por vir no dia seguinte (sábado), é que era a alma do negócio, a festa de um ano e um dia de ocupação. Então ficamos até umas 2h da manhã trocando idéia com os moradores, bebendo um limãozinho para espantar o frio e ouvindo as histórias de todos os obstáculos que eles tiveram nesses um ano e um dia. A dificuldade de construir, a repressão policial, a falta de compromisso do governo. Só pra vocês terem uma idéia, o acampamento foi incendiado 5 vezes. Vocês conseguem visualizar o que seria você construir um barraco e a polícia queimar? Você construir de novo e a polícia queimar de novo? Você construir pela terceira, pela quarta e pela quinta vez e a polícia queimar 3, 4, 5 vezes? É, isso aconteceu. E essas pessoas têm mais do que 5 motivos para comemorar um ano e um dia de resistência.
Sábado, já pelas 7h da manhã a galera começava os preparativos da festa. Aliás! Esses preparativos já vinham se desenrolando desde sexta. Demos um rolé pela ocupação, entrevistamos alguns moradores, ouvimos umas letras de rap da molecada e às 9h começou a apresentação das crianças. O Márcio recitava uma historinha e a criançada repetia. Foi difícil conter as lágrimas na conversa com as crianças, onde a maioria dizia querer ser médico para salvar o país. Essa é a visão da criançada, um país doente. Essa é a realidade deles, pois eles não têm acesso às riquezas de um país que se entrega a cada dia para os estrangeiros.
Depois da apresentação das crianças chegou o som da festa. A galera da cozinha começou a queimar uma carne enquanto do outro lado se confeitava um bolo gigantesco, afinal, não é todo dia que você comemora um ano e um dia.
Você deve estar se perguntando: Que diabos é isso de um ano e um dia?
O mais importante nessa história, ou seja, o objetivo desse texto é mostrar pra vocês que existem pessoas que não concordam com esse modelo que o sistema impõe pra gente. E que essas pessoas, além de não concordarem, tomam providências para fazer valer o seu direito, nesse caso, direito a terra.
Cacau Amaral
23/5/2004