Donana na Tijuca: Cinema, Música, Poesia

Logo ao adentrar o SESC Tijuca, neste sábado, para projeção de nosso filme “Donana”, senti um ótimo clima, onde, aos poucos, os acontecimentos alimentaram uma vontade danada de escrever sobre esse grande dia. A cada momento percebia mais e mais uma série de coincidências que mais tarde foram sabiamente compiladas por Paulo Lins, em seu bate papo com o público.

No elevador, encontrei Viviane Sales, do Sarau Poesia na Esquina, da Cidade de Deus. Conheci essa menina, acho que há dois anos, em um bate papo a respeito de meu primeiro longa, 5X Favela. Naquela época, ela estava prestes a assumir a maior responsa na TV aberta, com outro parceiro, meu, de teatro, cinema, TV; o Kadinho. Na tarde de hoje; Viviane manipulava o microfone com maestria, apresentando o sarau junto com Ivone Landim, do Coletivo Pó de Poesia.

Ivone, outra figura. Fui conectado a ela por Dida Nascimento, personagem do filme Donana. Assim como Lauro Farias, Da Ghama, Ras Bernardo, Marcelo Yuka… Todos peças- quebra cabeças. Ivone é linha de frente no Sarau Donana, em Belford Roxo. Hoje conheci uma porrada de projetos dela. O que mais se fixou em minha cabeça foi o livro de pano. Genial. Viajo nessa mina e agora com essa história de livro de pano, fico pensando a respeito da era digital. Como nos tornamos dependentes de certas máquinas e como o tempo nos mostra que independente de acesso, a periferia sempre busca e encontra linguagens para se manifestar.

Bem… Após escrever um parágrafo apresentando a Vivi e outro a Ivone… O que essas duas mulheres estão fazendo, juntas, nesse evento, na Tijuca? Essa conexão, Cidade de Deus, Belford Roxo, me instiga. Talvez porque esse foi um dos principais motivos que nos inspirou a realizar o filme Donana. A conexão com esse universo, de Bel, bem antes de o conceito de rede social se restringir ao mundo virtual. Costumamos dizer que o Cineclube Mate com Angu poderia ter nascido em Bel, no Donana. Estávamos lá.

Mas apenas alguns anos depois nos encontramos e fundamos o coletivo que mudaria nossas vidas. Nessa ocasião, pensamos a respeito de essa coisa de conexão. De rede social. De pegar três ônibus para ouvir o som que você gosta. E como uma… duas… décadas depois, essa história fica restrita a quem “estava lá”. Podemos contá-la de voz em voz; nos bares, nas esquinas, nos saraus; ou podemos contá-las através de um filme.

Durante o bate papo, após o público assistir o filme, a reação de quem não conhecia a história me faz refletir a respeito do elo construído pelo filme. Não pelo Donana. Pelo cinema para ser mais específico. Percebo que de alguma maneira, a conexão que me levou a conhecer Dida Nascimento e sua trupe é a mesma que leva o público, hoje, conhecer aquela história. Que é a mesma história contada por Paulo Lins, Yuka, Nelson Sargento… A história da periferia.

Da mesma maneira que o Centro Cultural Donana foi meu elo de ligação com Belford Roxo; também foi o elo que ligou Yuka. Hoje, observando essa conexão entre Belford Roxo e Cidade de Deus, o carinho que a Viviane tem com Paulo Lins e ele com ela. Como tudo está acontecendo aqui, na Tijuca, e como Marcelo Yuka, esse tijucano genial, personagem do filme, diversas vezes citado por Paulo Lins no bate papo a respeito de sua trajetória com cinema, poesia e música. Viajo ao momento que estava na Cidade de Deus, discutindo com Rodrigo Felha como seria o filme 5X Favela.

Paulo Lins dispensa apresentações. Não o conhecia pessoalmente, mas nossa conexão é forte. Seu principal livro inspirou meu principal filme. 5X Favela. Ele produziu várias paradas com Yuka, que também é personagem do Donana. Paulo falou bastante a respeito de sua ligação com a poesia. Seu primeiro livro foi de poesias. Também sobre Cidade de Deus, que nasceu como relatos cronológicos e depois teve que ser adaptado para um romance.

Essa ligação entre o cinema e a literatura é forte. O roteiro de Donana também nasceu como uma sucessão de fatos cronológicos, que mais tarde foi tomando cara de roteiro e cedendo espaço à dramaturgia. As vezes fica até difícil decifrar se um livro é produzido através de fatos que aconteceram ou ações inventadas. Quando li “Suburbano Convicto”, de Alessandro Buzo, escrevi ao autor e perguntei se suas histórias eram inventadas ou não. Achava muito parecidas com as que aconteciam no meu bairro. Talvez nunca tenha essa resposta. Nem mesmo o Buzo deve ter. Depois que vai pro papel, ferrou. Vira verdade.

Paulo Lins citou o sucesso dos Sarau Suburbano, organizado pelo Buzo. Que assim como o Sarau Cooperiferia, criado pelo Ségio Vaz, e Sarau do Binho; parecem até shows com mais de mil pessoas por evento. O clima aqui da Tijuca estava bem mais light, mas perceber esses crescimento de público, sobretudo o público que não lia, em eventos como Sarau Donana e Poesia na Esquina é um grande prazer.

DONANA NA TIJUCA

Sobre Cacau Amaral

Cineasta brasileiro. Direção em 5X Favela; 1 Ano e 1 Dia; Cineclube Mate com Angu; Sociedade Musical Lira de Ouro; Programa Espelho e Aglomerado. https://cacauamaral.com/
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